Wednesday, May 9, 2007
Hora da arrumação
Resolveu que era hora de fazer uma faxina naquele conjugado. Um quarto, sala, banheiro e cozinha com vista para a mais movimentada avenida. O pequeno conjugado estava abarrotado de velhas idéias, pensamentos inúteis, antigos desejos, medos infundados. Ele era a sua consciência. Começou pela cozinha onde existia um fogão de duas bocas, junto com pilhas e pilhas de papéis. Pegou um papel amarelado e começou a ler. Lá estava descrita a promessa de seguir filosofia. Promessa feita na adolescência, ainda nos tempos do colégio. Há muito tinha esquecido a promessa e seguido outros rumos. Mas a promessa estava lá, ainda guardada. Será que existia tempo de voltar atrás, ou sei lá, voltar o tempo. Não. Resolveu não descartá-la, deveria guardá-la e se lembrar de quem foi um dia. Mas se guardasse todos os pensamentos, promessas e desejos antigos não poderia abrir espaço para a entrada de coisas novas. A arrumação perderia o sentido. Caminhou até a sala, já sem saber o que fazer. Tropeçou no antigo desejo de casar com o primeiro namorado. Consultou seu coração para ver se o jovem rapaz ainda morava lá. Seu coração era um enorme apartamento com quatro suítes e vista para o mar. Ele já tinha se mudado há alguns anos. Experimentou uma agradável sensação em descartar esse desejo. Resolvida, ou num impulso, voltou à cozinha e queimou a promessa da adolescência. Não precisava se lembrar de quem tinha sido um dia, isso não importaria se ela estivesse feliz com quem é. Queimou, rasgou, guardou, arrumou, riu e chorou com tantos pensamentos e lembranças. O que valia a pena ela mandou morar no coração que era mais espaçoso e acolhedor. O conjugado ficou lindo, cheio de espaço. Até a vista ficou mais bonita.
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